Ozempic® e a Ilusão do Atalho: Quando a Estética Ultrapassa a Ética

O uso indiscriminado da semaglutida (Ozempic®), fármaco originalmente indicado para o manejo do diabetes tipo 2, tem ultrapassado os limites da racionalidade clínica ao ser alçado ao status de solução estética para o emagrecimento rápido. Embora estudos robustos como o STEP 1 (Wilding et al., NEJM, 2021) evidenciem sua eficácia em pacientes com obesidade e comorbidades, a extrapolação de seu uso para indivíduos saudáveis, sem indicação médica e acompanhamento adequado, revela um fenômeno preocupante: a medicalização da aparência e o esvaziamento do cuidado integral.

É inquietante observar como discursos aparentemente técnicos, porém desvinculados do rigor científico, vêm normalizando a prescrição informal ou o incentivo velado ao uso de um fármaco com efeitos adversos relevantes — náuseas intensas, risco de pancreatite, alterações no trato digestivo e até quadros de desnutrição proteico-calórica em indivíduos já vulneráveis. A busca por resultados imediatos, quando conduzida fora de parâmetros éticos, transforma o processo de emagrecimento em produto de consumo, distanciando-se dos princípios fundamentais da atenção à saúde.

No cenário atual, proliferam promessas que simplificam aquilo que é, por natureza, complexo. Estratégias sensacionalistas, amparadas por linguagem técnica sem respaldo clínico, fomentam falsas expectativas e expõem o indivíduo a riscos evitáveis. A adesão acrítica a essas soluções temporárias compromete não apenas o bem-estar físico, mas também a autonomia e o discernimento do sujeito.

Cuidar é mais do que reduzir números na balança — é respeitar ritmos, considerar contextos e cultivar escolhas duradouras. A ética do cuidado exige silêncio diante do modismo e firmeza diante da pressa. Profissionais comprometidos não vendem atalhos: oferecem caminhos sustentáveis e seguros, ainda que menos espetaculares.

Gisele Moretti
Nutricionista Clínica – CRN3 67264
Rua Buri, 21 - Bom Jesus
@gihnutri

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