O mundo vivenciou uma pandemia, que se iniciou oficialmente em 2020, a qual até hoje ainda afeta muitos lares. Milhares de pessoas não tiveram a sorte de sobreviver a ela e muitas, se quer conseguiram tomar a primeira dose da vacina. Entretanto, quem passou pelos anos de angústia, ficou com sérios danos psíquicos.
Paralelo a isso, em um cenário onde distúrbios psíquicos são cada vez mais frequentes e discutidos, muito possivelmente você já deve ter ouvido falar na Síndrome de Burnout. A condição foi reclassificada recentemente pela Organização Mundial da Saúde, e está relacionada ao esgotamento profissional.
Infelizmente, a Síndrome tem se tornado uma grande preocupação de saúde, por ser um quadro recorrente em pessoas que trabalham sob pressão. Os sintomas de Burnout podem se manifestar de forma sutil, com pequenos sinais de estresse e cansaço excessivo.
Conhecer mais sobre ela pode ajudar a identificar o quadro e buscar maneiras para revertê-lo. Isso é possível por meio de ajuda profissional para cuidar da saúde mental e também mudando alguns hábitos.
A Síndrome pode ser prejudicial a diversas áreas da vida e não somente à rotina profissional do indivíduo. Entre as consequências estão sintomas como ansiedade, nervosismo, tristeza, desapontamento e desânimo — podendo desencadear um quadro de depressão, que precisa ser acompanhado por um profissional capacitado.
Além do estresse crônico e do cansaço recorrente, alguns comportamentos e sinais podem ser indicativos da Síndrome de Burnout com tendência ao isolamento; agressividade e irritabilidade;
falta de concentração e dificuldades na memória; alterações bruscas no humor e ausências no trabalho. Sintomas físicos como dor de cabeça, dores musculares, insônia e distúrbios gastrointestinais, associados a alterações comportamentais, também podem ser indícios da Síndrome Do Esgotamento Profissional.
Além do diagnóstico clínico, um indivíduo com a Síndrome de Burnout ainda pode encarar pela frente o estresse no emprego, sendo confundido pelo seu empregador como preguiçoso, desinteressado e com queda de rendimento.
Neste sentido, a pessoa diagnosticada com a Síndrome também tem direitos e pode reivindicá-los por meio da justiça quando for incompreendido. Conversamos com a advogada Dra. Marcia Ribeiro, a qual falou um pouco sobre este caso e sua tese em relação à Síndrome de Burnout.
Prime - Qual o impacto que a Síndrome de Burnout tem causado nos ambientes de trabalho?
Dra. Marcia - A Síndrome de Burnout tem causado um impacto significativo nos ambientes de trabalho. Caracterizada pelo esgotamento físico e mental decorrente do estresse crônico relacionado ao trabalho. Essa condição afeta a saúde e o desempenho dos trabalhadores. A produtividade pode diminuir, aumentando o número de faltas, licenças médicas e rotatividade de funcionários. Além disso, a qualidade do ambiente de trabalho e a relação entre empregados e empregadores podem ser comprometidas.
Prime - O empregador acredita que o empregado possui tal patologia ou tem levado isso como falta de atenção, cansaço e preguiça do funcionário?
Dra. Marcia - Infelizmente, em alguns casos, os empregadores podem não reconhecer a Síndrome de Burnout como uma condição médica legítima. Em vez disso, podem interpretar os sinais de exaustão e falta de energia como falta de atenção, cansaço comum ou até mesmo preguiça do funcionário. Isso pode levar a uma falta de compreensão e apoio adequado por parte do empregador, o que agrava a situação do trabalhador afetado.
Prime - Um empregado com a Síndrome diagnosticada pode ser mandado embora?
Dra. Marcia - Após o reconhecimento da Síndrome de Burnout como doença do trabalho, um empregado com o diagnóstico dessa condição não pode ser demitido por esse motivo. A legislação trabalhista brasileira garante a estabilidade provisória ao empregado que esteja incapacitado temporariamente para o trabalho em decorrência de doença ocupacional, inclusive a Síndrome de Burnout. Neste caso, o empregado tem direito à estabilidade por um período após o retorno ao trabalho.
Prime - A Síndrome de Burnout passou a ser considerada uma doença do trabalho. Como foi isso e quais direitos após 2022 o trabalhador passou a ter?
Dra. Marcia - Em 2022, a Síndrome de Burnout foi oficialmente reconhecida como uma doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Esse reconhecimento trouxe alguns benefícios e direitos para os trabalhadores afetados. Entre eles, destacam-se a possibilidade de afastamento médico, acesso a tratamentos especializados e a estabilidade provisória no emprego, como mencionado anteriormente.
Prime - Você acredita que em decorrência da pandemia esta Síndrome possa ter acometido mais pessoas?
Dra. Marcia – Sim, é possível que a pandemia tenha contribuído para o aumento dos casos de Síndrome de Burnout. As restrições, mudanças na rotina de trabalho e o aumento do estresse vivenciados durante a pandemia podem ter sobrecarregado muitos trabalhadores, levando a um desequilíbrio entre vida pessoal e profissional. Além disso, a pressão adicional e as preocupações relacionadas à saúde, segurança no trabalho e incertezas econômicas podem ter exacerbado os sintomas da Síndrome de Burnout.
Prime - Você já atendeu ou atende algum cliente com esta Síndrome? Pode nos relatar os casos, claro sem identificá-los?
Dra. Marcia – Como advogada, já atendi clientes com Síndrome de Burnout. Em um dos casos, um profissional da área da saúde relatou um ambiente de trabalho altamente demandante, com longas jornadas e pressão constante. Essa situação resultou em esgotamento físico e mental, afetando sua saúde e produtividade. Em outro caso, um bancário apresentou sintomas de exaustão emocional e despersonalização devido à sobrecarga de trabalho e falta de apoio institucional. Em ambos os casos, busquei garantir os direitos dos clientes, incluindo afastamento médico, tratamento adequado e estabilidade no emprego.
Prime - Temos percebido principalmente professores sendo afastados ou tirando licença por conta de esgotamento. Esta é uma classe bastante afetada, você conhece algum caso?
Dra. Marcia - Sim, a classe dos professores tem sido particularmente afetada pela Síndrome de Burnout. O ambiente educacional pode ser extremamente desafiador, com altas demandas emocionais, pressão por resultados, sobrecarga de trabalho e falta de reconhecimento. Esses fatores podem levar ao esgotamento físico e mental dos professores. Conheço casos de professores que precisaram se afastar temporariamente devido ao diagnóstico de Síndrome de Burnout, buscando tratamento e recuperação para poderem retornar às suas atividades profissionais com saúde e motivação.
Prime - De que forma a pessoa com a Síndrome deve proceder para assegurar os seus direitos? Qual o papel do advogado nestes casos?
Dra. Marcia - Para assegurar os direitos de uma pessoa com Síndrome de Burnout, é importante seguir alguns passos. Primeiramente, é fundamental buscar um diagnóstico médico adequado com um profissional de saúde especializado. Em seguida, o trabalhador deve informar o empregador sobre a sua condição e, se necessário, solicitar o afastamento médico. Caso o empregador não reconheça a Síndrome de Burnout como doença ocupacional ou se recuse a fornecer os direitos assegurados, o trabalhador pode buscar o apoio de um advogado especializado em direito trabalhista. O advogado desempenhará um papel fundamental na orientação jurídica, na defesa dos direitos do trabalhador e na busca por medidas legais para garantir a estabilidade, tratamento adequado e demais direitos relacionados à Síndrome de Burnout.
Prime - Deixe-nos as suas considerações finais e a sua tese enquanto advogada.
Dra. Marcia - Como advogada trabalhista, minha tese é que a Síndrome de Burnout como doença ocupacional pode gerar o direito ao Auxílio-Acidente. A lei reconhece que a doença ocupacional se equipara ao acidente do trabalho. Portanto, se o indivíduo que apresenta esse tipo de doença e sofre perda parcial da capacidade de trabalho em razão dela, passa a ter direito ao Auxílio-Acidente e com a Síndrome de Burnout deveria ser da mesma forma. Porém, tudo é muito novo e temos que aguardar as decisões judiciais para ver como os Tribunais vão entender essa questão.